O que é e o que não é fé?
O que, então, é fé? Historicamente, o
cristianismo ortodoxo respondeu essa a questão distinguindo três principais
elementos que, juntos, compreendem a fé salvífica. Falando de maneira geral,
três palavras latinas foram usadas para identificar esses três elementos: notitia, ou “conhecimento”; assensus, ou
“assentimento”; e fiducia, ou “confiança”
O primeiro elemento da fé salvífica é notitia, ou conhecimento, que aponta para o fato de que a fé genuína
deve crer em alguma coisa. Em outras palavras, ela deve ter conteúdo
intelectual, deve ser baseada no conhecimento de certas verdades fundamentais.
Romanos 10.9, que afirma que “se... creres que Deus ressuscitou [Jesus] dentre
os mortos, serás salvo” há um conteúdo doutrinário para a fé. Fé
significa crer em certas proposições; nos exemplos citados acima, as
proposições são “que Deus ressuscitou Jesus dentre os mortos” e “que Jesus é o
Cristo, o Filho de Deus”.
O segundo elemento da fé salvífica é assensus, ou consentimento; parecer favorável. Isso se refere à
convicção intelectual de que o conhecimento que alguém possui é factualmente
verdadeiro e pessoalmente benéfico. Nós vemos esse elemento de fé
retratado em passagens bíblicas como João 5.46-47; 8.31-38, 45-46; 10.37-38;
14.11.
O terceiro elemento da fé salvífica é fiducia, ou confiança. É de longe o mais importante dos três
elementos que mencionamos. Sem esse elemento, a fé é meramente um
empreendimento intelectual, esse elemento consiste em uma confiança
pessoal em Cristo como ele é oferecido no evangelho, e uma completa confiança
nele para a salvação. Ele é visto em passagens que falam sobre crer “em”
Jesus (por exemplo, Jo 3.15-16; Rm 9.33; 10.11) e em passagens que falam de
“inclinar-se” ou “repousar” sobre Jesus (Sl 71.5-6; Pv 3.5-6), “olhar” para ele
(Jo 6.40; Hb 12.1-2), e “comprometer-se” com ele (2Tm 1.12; Mt 11.28; Sl 37.5).
Os três elementos ilustrados
Considere a seguinte ilustração.
Imagine que quatro pessoas são lançadas sem comida ou água no meio de um campo
muito extenso cheio de minas terrestres. Suponha que um dos indivíduos
cegamente escolha um caminho pelo campo e siga naquela direção sem hesitar.
Esse não é um exemplo de fé, mas é mais como aquela tolice da qual falamos
anteriormente. Fé genuína não é cega; é baseada em conhecimento.
Mas suponha que um helicóptero
apareça sobre os três homens que restaram, e do helicóptero, uma parte
interessada anuncia o caminho pelo campo minado. Um dos homens confia na
palavra da parte interessada e caminha de uma vez pelo campo minado. Isso
também não é um exemplo de fé. Sim, as ações do homem são baseadas em
conhecimento (o testemunho da parte interessada) e consentimento (o homem
considera o testemunho como verdadeiro e benéfico em atender as suas
necessidades). Mas a sua ação ainda é cega, pois é baseada em conhecimento
insuficiente (isto é, o testemunho incerto de um completo estranho). Ela também
carece do mais importante elemento da fé: confiança pessoal naquele que fala.
Suponha, contudo, que os dois
homens restantes façam certas perguntas à parte interessada para discernir como
ele veio a conhecer o caminho correto do campo, por que ele quer ajudá-los e o
quão certo ele está de que pode guiá-los seguramente através das minas
terrestres. Suponha que eles também peçam referências da parte interessada para
ver se ele conhece alguém que eles conheçam ou a quem sejam relacionados.
Suponha que eles até mesmo tentem testar as suas instruções, lançando objetos
na direção que ele sugere para ver se parece estar livre de minas. Ao fazer
tais coisas, os dois homens restantes estão reunindo conhecimento suficiente
para decidir se podem confiar no indivíduo do helicóptero. Essa confiança (fiducia),
que é edificada sobre um conhecimento (notitia) e consentimento a tal
conhecimento (assentus), é do que se trata a fé.
Tal fé não é “boba” de maneira nenhuma, mas completamente razoável.
Quando notitia, assensus e fiducia estão presentes juntos, há verdadeira fé. E
quando há verdadeira fé, boas obras necessariamente seguirão. Boas obras não
são parte da fé; elas fluem da fé. É somente a fé que recebe o dom de Deus da
justificação, mas fé que justifica nunca estará sozinha; ela sempre se
manifestará em boas obras.
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